Primeira Parte:
IMORTALIDADE
E naqueles dias os homens buscarão
a morte e não a acharão, desejarão
morrer e a morte fugirá deles.
(Apocalipse, I X, 6)
Ele era apenas um garoto. Sonhava todos os dias com a morte. Às vezes ela aparecia de véu e grinalda, outras vezes vinha nua, mas sempre na figura de uma bela mulher. Ora Loira, ora morena, porém sempre bela.
A amava de modo incondicional, como apenas os garotos amam. Até que um dia ela desceu de um sonho e pousou sobre sua cama, tirou o véu, a grinalda. Desposou-o.
Entretanto, como às vezes acontece quando se ama, assim que saciado o desejo coube ao garoto solidão perpétua.
Para o seu azar, tornou-se imortal.
Segunda Parte:
UMA MULHER COMO RECLAMAM OS POETAS
E, pondo-a no meio disseram-lhe:
Mestre, esta mulher foi apanhada,
no próprio ato, adulterando.
(João, VIII, 4)
Todas as noites ela caminha em direção ao enorme baú de carvalho em que repousa o vestido branco, a longa calda, o pálido véu, a grinalda. Cuidadosa, entre adornos, de mais fluída transparência e a mais triste sorriso, veste-se.
Alimentando-se de sonhos, de porta em porta, se entrega às volúpias dos amantes, em seguida abandonados às convulsões.
Impiedosa, chora apenas quando na luz do dia não se pode mais ouvir o clamor: não te rias de mim, meu anjo lindo!
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